Geocaching: à procura do ‘tesouro’ escondido

É visto por muitos como a caça ao tesouro dos tempos modernos. De GPS na mão, muitas vezes com o apoio de pistas, os praticantes do geocaching vão à procura da geocache escondida. A atividade ainda não é conhecida por todos, mas tem despertado o interesse, em Barcelos.

José Macedo segue as coordenadas GPS. Está de costas para a Igreja Matriz. Diz a pista que, à esquerda, está «o castelo com o seu esplendor,/ ao centro do jardim o pelourinho/ e, mesmo no cantinho,/ bem escondidinho,/ encontras o primeiro tesourinho,/ mas que belo/ alojado na parede lateral do castelo». Embora o faça com pouca frequência, o barcelense de 35 anos pratica geocaching com amigos, há cerca de três anos.

Tomou contacto com a atividade através de um conhecido: «quando me falou nas caches, ele estava mesmo viciado no jogo. E eu pensei “ui, o que é que é isso?”». «Ele levou-nos logo a descobrir uma. Realmente aquilo era mesmo porreiro e, chegando a casa, inscrevi-me logo no site e comecei logo a procurar mais caches», conta.

André Araújo é geocacher há menos tempo (há um ano e seis meses); o estudante de 25 anos diz-se «novato nestas andanças», mas tem já «imensas aventuras e histórias para contar». André soube o que era o geocaching através de familiares. «Um dia vi dois primos meus e os seus amigos, perto da minha casa, à procura de algo entre as paredes e a pôr a mão em buracos e frinchas», recorda. Perguntou o que estavam a fazer e, no dia seguinte, André pesquisou na Internet e inscreveu-se no site do geocaching. Foi o começar de uma aventura, que conta já com 316 caches encontradas, um pouco por todo o país.

Adelino Silva fizera geocaching em tempos, mas desistira. Voltou à prática desta modalidade «de forma “séria”, há quase um ano». A fotografia é um dos hobbies de Adelino para quem, sublinha, «os locais mais bonitos em termos de natureza ou património histórico e cultural têm uma cache». A prática da atividade voltou, então, em parte, para juntar o útil ao agradável: «fotografar fazendo geocaching ou fazer geocaching fotografando», clarifica.

Agora, Adelino aproveita todas as oportunidades para procurar alguma cache e fá-lo habitualmente acompanhado. «Sempre que vou a algum lado e tenho tempo, páro um pouquinho para fazer pelo menos uma cache. Como costumamos dizer, “para pôr mais um sorriso no mapa”. Isto porque, quando a cache é encontrada, o nosso mapa mostra-a como um smile sorridente», explica.

Geocaching promove valorização do património e da natureza

José Macedo passa a Ponte Medieval, procurando seguir a pista que encontrara na primeira cache. Do lado de lá do rio Cávado, as pessoas que passam ou as que contemplam a paisagem olham o jovem com estranheza. Não entendem por que razão anda determinada pessoa, durante algum tempo, a afastar as ervas, a tatear as árvores. Também Adelino Silva conta que, em determinados locais, os geocachers são «muito “vigiados” pelos vizinhos» e que nem sempre é fácil explicar a um muggle – ou seja, a quem não faz geocaching – o conceito do jogo. Mas, atenta, também «há pessoas que já conhecem e até cuidam das caches».

Para grande parte das pessoas, o geocaching mais não é do que um estrangeirismo, com significado desconhecido. Trata-se de uma atividade de lazer, que se assemelha desde logo à orientação, e através da qual se incentiva o contacto com a natureza e o espírito de descoberta, pela aventura.

Adelino Silva entende que o geocaching promove a valorização do património histórico e cultural. Lembra que pode inclusivamente ser um impulso à atividade turística de determinada região: «há municípios e outras entidades que estão a apostar nesta forma de levar turistas a visitar aqueles locais mais escondidos e pouco visitados pelo simples facto de não estarem ao pé das estradas e por estarem menos visíveis». «Se tiver uma cache, o geocacher vai lá. Se gosta, vai contar aos amigos. Além disso, vai publicar fotos ao efetuar o registo da cache», atenta o geocacher, de 46 anos, que vê aqui promoção turística.

Através do geocaching, os praticantes vão conhecendo melhor certos locais, ou outros até então desconhecidos. André Araújo lembra a «quantidade de paisagens, monumentos e muitas outras coisas que se descobre com uma simples cache». «Até no meu próprio concelho descobri sítios e monumentos magníficos, que até hoje não sabia que existiam», revela.

A prática do geocaching estimula também a preservação do ambiente e cuidados com a natureza. José Macedo aponta para uma prática da atividade com respeito pela natureza: «sobretudo em montanha, acho que, como em qualquer caminhada, deve respeitar-se o que lá está». Também André Araújo considera que a atividade tem essa finalidade. E clarifica: «no geocaching, são usados vários acrónimos e um deles é o CITO (Cache in trash out), que significa “faz a cache e traz o lixo contigo”, pois a preservação do meio ambiente é um dos lemas do geocaching».

Tudo terá começado no início do século XXI, nos Estados Unidos. A 3 de maio de 2000, Dave Ulmer colocou, pela primeira vez, uma geocache e divulgou a sua localização num site. Passados três dias, a cache já tinha sido encontrada duas vezes e registada uma. Agora, a atividade envolve 2 271 569 geocaches ativas e mais de seis milhões de geocachers em todo o mundo.

Numa caixa fechada e à prova de água, as geocaches são classificadas de um a cinco, de acordo com o seu grau de dificuldade, bem como da complexidade do acesso ao local. Há, de resto, as geocaches tradicionais (as mais frequentes), passando pela multi-cache (que obriga a visitar pontos intermédios, até determinar a localização final), pelos enigmas (que implicam a sua resolução) e também cache-eventos (que permitem que os praticantes da modalidade se encontrem e conheçam). Temáticas ou simples, podem ser feitas a pé ou de bicicleta, aponta André Araújo. Adelino Silva confessa que, cada vez mais, se surpreende com a imaginação do criador/dono da cache – o wouner. «Desde troncos de árvores, flores, caracóis, pedaços de troncos a imitar galhos velhos nas árvores, pedras perfuradas e muito bem disfarçadas», exemplifica. Aquela, porém, de que mais gostou foi uma «feita em madeira, toda pintada à mão em forma de um abrigo para as aves fazerem ninhos nas árvores. Tem o nome de Home Sweet Home». José Macedo lembra uma outra, no Gerês, na Rocalva, que estava pendurada numa parede. «Nunca mais a encontrava. Para lhe chegar, foi preciso trepar, escalar a parede», recorda. Para já, o barcelense mantém-se à procura da segunda geocache do trilho dos direitos, algures por Barcelinhos.


Trilho dos Direitos da Criança

Concebido por iniciativa da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Barcelos, o Geocaching dos Direitos resulta do trabalho de várias entidades. Explorável a partir de 1 de junho deste ano, foi, pois, uma forma de assinalar o Dia Mundial da Criança, não de modo momentâneo, mas que perdurasse no tempo. O objetivo é, de facto, o de «trabalhar a temática dos direitos da criança/jovem de modo pró-ativo, lúdico, criativo e exploratório», explica a CPCJ de Barcelos.

É também este caráter lúdico que faz com que, o logbook em cada geocache, ou seja, o bloco onde o geocacher regista a sua passagem, tenha a particularidade de ser ilustrado de forma alusiva ao direito, sendo que todas as ilustrações dos direitos da criança que estão nestes blocos são da autoria de Manuela Pinheiro, do Banco Local de Voluntariado.

Dentro de cada cache, para além deste livro ilustrado, representativo de um dos direitos da “Convenção sobre os direitos da criança”, os geocachers encontram ainda um lápis para escrita, informação breve sobre a CPCJ e um objeto representativo do direito retratado (que pode ser trocado por outro de igual significado). «Tentamos selecionar direitos que percorressem o propósito da Convenção e representá-los através da escolha de objetos muito intrinsecamente relacionados com esses direitos», explica a CPCJ de Barcelos. E exemplifica: «numa das caches, relativa ao artigo 31.º da Convenção [“Os Estados Partes reconhecem à criança o direito ao repouso e aos tempos livres, o direito de participar em jogos e atividades recreativas próprias da sua idade e de participar livremente na vida cultural e artística”], o objeto é um berlinde e o desenho do livro é uma criança a brincar».

O Geocaching dos Direitos é constituído por um total de dez caches, escondidas pela zona mais histórica da cidade. Para além de dar conta de determinados direitos da criança de uma forma mais criativa, este circuito é também um modo de dar a conhecer Barcelos, através dos seus pontos históricos. A CPCJ tentou que o trilho contemplasse zonas que entendem ser «emblemáticas da cidade e que os jovens devem conhecer, explorar e orgulhar-se».
Este trilho tem a particularidade de só ter coordenadas GPS no primeiro ponto. Para chegar às geocaches seguintes, o praticante deve seguir as pistas – «escritas em verso e de modo enigmático, para estimular mais a criatividade e a descoberta», atenta a CPCJ de Barcelos – que lhe são dadas na anterior.

Pensado inicialmente para ser feito por jovens em acolhimento, este trilho está atualmente em processo de registo no site do geocaching, para assim ser acessível e do conhecimento de todos os praticantes da modalidade.

| Reportagem publicada na edição 0.3 do Obli (dezembro de 2013) |

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